sábado, 26 de março de 2011

Me & Mr. Jones.


O banco em que eu sentei estava gelado e minhas pernas estavam ficando dormentes. O céu estava cheio de nuvens e elas pareciam estar ao alcance dos dedos, bastaria eu esticar a mão... As folhas das árvores dançavam com o vento e faziam um barulho de arrepiar a espinha. Olhei ao redor e para o relógio. Como sempre, ele estava atrasado.

Havia uma sombra muito parecida com a de uma pessoa no canto da parede. Homem. Parecia muito com um maníaco que não hesitaria em me matar. Ótimo, estava começando a ter devaneios. A solidão faz dessas coisas com qualquer um, ou enlouquece de vez ou faz uma grande viagem a si mesmo. Senti um arrepio na nuca e me virei, lá estava aquele rosto, próximo demais.

"Boa noite", ele disse com um olhar de estranho.
"Atrasado" e entortei a boca.

Olhei para o canto na parede e lá só havia o costumeiro pé de acerola, nada de sombra. Olhei para o céu enquanto ele sentava ao meu lado e as nuvens haviam passado. Agora parecia que tinham jogado purpurina prateada num tecido preto: eram tantas estrelas que nem me atrevi a contar, parecia que o céu estava em festa pela chegada dele.

O rosto do rapaz vinha em direção ao meu.

Não existia mais som das folhas contra o vento, nem nuvens, nem frio, nem sombra. Só eu e ele. O arrepio que eu sentia já não era de frio e sim de felicidade por finalmente tê-lo perto. Não existiam mais monstros prontos para atacar, nem a raiva do atraso. Existiam abraços, beijos e nós difíceis de desatar.

terça-feira, 22 de março de 2011

Carnaval.

O céu se divide em cores azuis verdes amarelas laranjas e vermelhas. As nuvens velejam pelo céu em direção à noite.
Uma pipa rebola enquanto um amontoado de crianças comandam-na do chão. É uma segunda de carnaval e a rua está quase deserta.

Um vira-lata perambula pela calçada em busca dos restos que serão seu jantar. Alguém na rua liga o som e agora a voz de algum cantor de axé enche a rua, parece que as coisas vão começar a animar. Ainda estou entediada. A varanda me dá uma visão privilegiada de tudo o que acontece fora, mas melhor seria estar junto do movimento.

Dentro de casa, minhas irmãs se arrumam com direito a todo tipo de maquiagem que se possa imaginar. Todas as cores do céu vão aos seus rostos e o brilho do Sol está em seus olhos.

Eu, que não quero ficar dentro da casa, nem posso sair, escolho a imaginação.

Yes, I don't.

"Do you speak english?"

Momento de tensão. Você está sentado na cadeira da escola nova e logo no primeiro horário tem aula de inglês. O professor entra imponente e tem cara de quem gosta de ver os alunos sofrerem. Após perguntar o seu nome e de qual escola você vem, ele te pergunta se você sabe falar inglês, coisa quase tão clássica quanto os trotes de faculdades. Você sabe o que deve responder, mas sua consciência não deixa.

Afinal, você desenrola um cat, dog e beautiful, mas falar fluentemente são outros quinhentos. Mesmo com toda a sala sabendo o que você ia responder, já que você está no 2º ano do Ensino Médio, e você com as palavras na ponta da língua, saiu aquilo que você temia:
"Yes, I don't."

O choque foi parcial, já que metade da sala ria. Não, você não havia enlouquecido. Só havia sido sincero. Estranho que só um erro pudesse ser tão perfeito para essa ocasião.

Enquanto a sobrancelha do teacher vai arqueando, você trata logo de ir se explicando.
"Bem, eu sei que a resposta que dei é difícil de se ouvir, mas é o que sei que é verdade. Acredito que consigo me comunicar com algum gringo. Se isso é falar inglês, não sei, só sei que consigo fazer. Entretanto, como ainda não conclui nenhum curso e estou aqui para aprender, acredito que não."

O professor pergunta novamente, dessa vez chamando o seu nome, e você se dá conta que passou os últimos 4 minutos pensando no que seria melhor pra dizer.
"Yes, I do." Mentiu.

Melhor seria não causar tumulto no primeiro dia de aula.

sábado, 12 de março de 2011

Swinging.



Tomo impulso com as pernas e me movimento para trás, solto a força que estava fazendo e me deixo ir pra frente. O brinquedo em que estou sentada me impulsiona pra frente. Tenho que me segurar nas correntes amarelas ao lado do assento. Sinto o vento vir contra o meu rosto e meus olhos lacrimejam. Sinto como se nada pudesse me parar e a viagem não fosse ter fim.

Lembro da minha infância e de como esse era meu brinquedo favorito no parquinho de diversões. Acho que pela adrenalina liberada ao subir tão alto, pela sensação de liberdade.

Sinto que estou voltando porque meu cabelo vem à face. Parece que estou sendo puxada a um lugar conhecido. Raízes.
Que sensação de liberdade, que nada... O que importa é ter pra quem voltar no fim do dia. Ir, mas saber que um dia voltará pra onde saiu. Essa segurança é o que me faz gostar tanto.

Aliás, a adrenalina segura, firme, certa é que faz isso. Se é que é possível: a certeza. Ouço mamãe chamar e percebo que ela é a rédea que me puxa de volta pra casa, tal qual as correntes não deixam que o balanço vá longe demais. Longe como meus pensamentos que me fazem voltar ao passado.