domingo, 3 de junho de 2012

Lado A

Luz amarela, um café gelado, um homem com aspecto cansado olha para outro de olhos inchados. "Quando você quiser falar, sinta-se à vontade". E vai passar outro café.

Era noite e ele esperara sentado. Sentado e de olhos fechados. Sentado e a cabeça pendendo. Sentado e os óculos caindo. Sentado e o cachorro fez barulho. Era hora, cansara de esperar.
Ela havia saído pela manhã e já estava passando o jornal que antecedia a novela das 8. "Vou fazer uma visita a mamãe e não demoro". Não demora? Só se o relógio tiver parado.

Resolvera pegar o carro e passear com o cachorro, ele adorava ver a cidade à noite e o cachorro amava sentir o vento na fuça. Não precisou ir longe. Parou no primeiro bar para comprar cigarro e viu. Viu que o preço realmente tinha aumentado e que o vício ia virar um buraco era no bolso.

Olhou pra direita e notou uma mulher de vestido e batom vermelho que abraçava um homem enquanto ria. Ela levantou o rosto e ele sentiu aquilo no estômago. Como ela se atrevera a fazer aquilo com ele? Eles não haviam jurado amor eterno ou qualquer outro tipo de merda dessas?

Antes de ela conseguir erguer os braços pedindo calma, ele agiu. "ESSA É SUA MÃE, SUA CADELA?". Sangue nos olhos.
Gritar não adiantaria, sentia que tinha que colocar alguma coisa de podre pra fora e essa coisa era ela. Se jogar uma garrafa na cabeça dela tivesse sido suficiente, ele teria parado por aí. Sua vontade era de arrancar os cílios postiços que ela usava no soco, queria que aquela puta sentisse o que ele estava sentindo.

Com o coração esmagado, voou pra cima dela. O outro se meteu no meio, e por mais que tentasse acertá-lo e tirá-lo do caminho, sentia-se diminuto e insignificante. Abaixou os braços, olhou pra ela e cuspiu no chão. "O cachorro fica comigo, é a única coisa verdadeira que você me deu". Olhou pro outro, com pena e tristeza, soltou uma risada irônica.
Virou-se para o balcão, pagou o cigarro. Todos do bar estavam mudos, olhando-o com pena. Fez uma reverência e saiu. Fecharam-se as cortinas.

"Reiosse, essa mulher te acabou ein? Nem a barba você faz mais. Tá precisando tirar isso da cabeça."
"Eu tô precisando é reabastecer. Esse café não sai mais não?" E riu amarelamente.