domingo, 29 de junho de 2014

Se a saudade é maior que a distância

A perna que apoia a coxa bate insistentemente no chão. Toc toc toc toc faz a sapatilha rosa no piso de madeira. Ele estava atrasado. Após os olhares tortos do senhor sentado à mesa ao lado, resolveu esperar quieta. Como será que ele estava após tantos anos? Com certeza com a barba grande. Engraçado. Nele, ficava perfeitamente bem.

Ele chegou desfilando, felino, cabeça baixa e os olhos levantados. Atento, reparou na saia, na blusa e no sorriso. Ou talvez estivesse só analisando a presa. Ela nunca saberia. Chegou tímido, sentou, parecia que até que não eram próximos. Bastaram alguns minutos pra que tudo voltasse ao normal: eram eles dois novamente. Como se nem tivessem se separado.

Pareciam estar num livro: Memórias de Um Sargento de Milícias, entre um “beliscão e uma pisadela” se via amor. Amor porque a semelhança entre um beliscão e um amor arrebatador é que ambos deixam marcas e talvez, mas só talvez, essa fosse a intenção deles. Ele ia pra longe e ela ficaria. E as marcas também.

Ou só pareciam duas crianças. Quê é mais puro que amor infantil, primeiro amor? E essas coisas que nos atingem sem nem sabermos como começou e o que é. Andaram e riram e conversaram amenidades e tantas besteiras e mesmo com tantos “es”, não se cansaram.

Ela podia passar a tarde inteira com a cabeça no ombro dele, com a barba dele roçando na sua testa. Aproveitando as brincadeiras pra segurar sua mão. Ou fazendo nada, como na maior parte do tempo. E ele sabia disso. E ele gostava que ela fizesse isso porque realmente queria fazer.

No dia que ele foi viajar, ela o acompanhou à rodoviária. Ela saiu da casa dela e ele da dele. Apostaram corrida, ambos não querendo chegar, ambos querendo que o tempo parasse. O prêmio seriam dois abraços. Eles chegaram ao mesmo tempo, esperaram e quando a voz poliglota anunciou que o ônibus sairia nos próximos 15 minutos, ela o deixou na área de embarque. Hora de entregar o prêmio ao vencedor.

“Como se dá dois abraços quando a gente não quer se separar?”, ele disse.

E se separaram. Ele a beijou na testa e disse que eles se veriam quando ele voltasse. Ela o mandou ir andando antes porque não gostava de dar as costas à felicidade. E ele foi. Ela deu meia volta e andou rápido.
Ao chegar à parte envidraçada da rodoviária que dá perfeita visão da área de embarque, virou-se. Ele a observava. Acenou e foi embora. Ela não disse adeus. Porque dizer adeus seria colocar um ponto final num sonho. E ela não queria acordar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário